A greve dos médicos peritos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) está chegando aos 100 dias e pode se estender até o ano que vem. Os números da paralisação são alarmantes e prejudicam milhares de segurados que dependem do dinheiro de benefícios como, por exemplo, o auxílio-doença, para a sobrevivência da família.
O presidente da Associação Nacional dos Médicos Peritos (ANMP), Francisco Eduardo Cardoso Alves, afirmou que a greve poderá atravessar o ano. “A nova proposta do Governo Federal será votada nesta segunda-feira (14) pela categoria e, provavelmente, não será aceita, pois não contempla principais pontos da pauta de greve, como as 30h, fim da terceirização e a reestruturação dos níveis salariais, Assim, o movimento deve continuar até janeiro de 2016”, explica.
De acordo com o levantamento da ANMP realizado na última semana, já são mais 1,6 milhão de perícias que não foram realizadas durante a greve dos peritos do INSS. “Temos informações de que os segurados só estão conseguindo agendar a perícia no INSS para depois do Carnaval. E nas principais capitais brasileiras o agendamento da perícia está sendo realizado para o mês de junho”, revela o presidente da associação.
O INSS estima, porém, que aproximadamente um milhão perícias não tenham sido realizadas desde o início da paralisação – dia 4 de setembro. O órgão também esclarece, em nota oficial, que o tempo médio de espera para o agendamento da perícia médica “passou de 20 dias, antes do início das greves, para os atuais 61 dias, na média nacional”.
De acordo com o INSS, o quadro de médicos peritos é de 4.378 servidores, com salário inicial, para uma jornada de 40 horas, de R$ 11.383,54, chegando a R$ 16.222,88 no final da carreira.
Proposta insuficiente
O presidente da ANMP sustenta que a proposta do governo não é suficiente, pois “se limita a propor o aumento geral dado ao funcionalismo e a criação de um comitê, em lei, para definir um novo modelo para a carreira dos peritos. Além disso, não prevê a efetivação da jornada de 30h e o fim da discussão da terceirização das perícias”.
Francisco Alves diz que a questão da jornada de trabalho é um ponto de discórdia. O Ministério do Planejamento informou que os profissionais querem reduzir a carga horária de 40 horas para 30 horas, sem redução na remuneração. Porém, segundo o presidente da associação, 30 horas é a jornada praticada atualmente. “Já trabalhamos 30 horas, amparados por portarias internas do INSS. O que queremos é que isso seja reconhecido em lei”, critica.
Ele pontua que outra reivindicação prioritária é a reposição salarial de 27% divididos em dois anos. “Estamos abertos à negociação, mas não pretendemos aceitar esta proposta genérica do governo”.
População prejudicada
E esta longa greve dos peritos do INSS tem como principal problema a demora na concessão e na análise de benefícios por incapacidade como, por exemplo, auxílio-doença, e aposentadoria por invalidez. “É um dos segmentos mais procurados pela população, além de ser de caráter mais sensível e urgente”, afirma Marco Aurélio Serau Jr., professor e autor de obras em Direito Previdenciário.
A advogada Anna Toledo, especialista em Direito Previdenciário, avalia que que os segurados mais atingidos foram os incapacitados. “Principalmente os segurados em gozo de auxílio-doença, que não conseguiam reagendar suas perícias e prorrogações, tendo em vista a sistemática do INSS conhecida como ‘alta programada’. Ou seja, o perito, ao examinar o segurado, calcula o tempo estimado de permanência em gozo do benefício feito por um programa de computador utilizado pela autarquia, que eventualmente suspenderá automaticamente o benefício. Trata-se de uma verdadeira afronta aos direitos humanos e sociais, pois somente por meio de perícia médica é que se pode aferir se um segurado encontra-se ou não incapacitado para o trabalho”, observa.
O professor de Direito Previdenciário Rodrigo Sodero ressalta que também enfrentam problemas os segurados que pretendem a concessão da aposentadoria por invalidez; do auxílio-acidente; do benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) por deficiência, da aposentadoria especial (a análise da documentação referente aos agentes nocivos é feita pelo Perito Médico Previdenciário); da pensão por morte e do auxílio-reclusão (nos dois últimos benefícios, no caso de o dependente ser inválido ou deficiente).
Suspensão arbitrária
Anna Toledo alerta que, apesar da proibição da Justiça, alguns benefícios estão sendo suspensos durante o período de greve. “Existe, inclusive, uma Ação Civil Pública determinando a não suspensão dos pagamentos neste período; contudo, não é o que se vê. Os segurados, mesmo incapacitados e impossibilitados de serem periciados para garantir a manutenção de seu benefício, contabilizam o prejuízo financeiro pelas suspensões arbitrárias, fruto da sistemática introduzida pela ‘alta programada’”.
Na visão do professor Rodrigo Sodero, o auxílio-doença que já está sendo pago não pode ser interrompido caso o segurado apresente um pedido de prorrogação no prazo estipulado na “Comunicação de Decisão”, que é a partir de 15 dias antes, até a data da cessação do benefício.
Ele cita a Resolução nº 97, do INSS, de 19 de julho de 2010, que prevê que, uma vez apresentado pelo segurado pedido de prorrogação do auxílio-doença, o INSS deve manter o pagamento do benefício até a apreciação deste pedido após a realização de novo exame médico pericial.
“Infelizmente, o INSS não tem observado a sua própria Resolução, sendo cessados ilegalmente os benefícios dos segurados que, diante da greve dos peritos, não têm conseguido passar pela avaliação médico-pericial”, aponta.
O INSS informa, em nota oficial, que “para quem não foi atendido em decorrência da paralisação, os efeitos financeiros decorrentes dos benefícios concedidos retroagem à primeira data agendada”.
(Previdência Total)